Tomar a vacina é obrigatório pela lei, mas punição é branda
Por mais que não existam punições severas, a obrigatoriedade da vacina está prevista na lei brasileira. Promulgada em 1975, a lei 6.259, que instituiu o Programa Nacional de Imunizações, já ressaltava a obrigação de se vacinar. Nela, há previsão até mesmo da edição de medidas estaduais — com a prévia do Ministério da Saúde — para o cumprimento das vacinações. O advogado e professor universitário da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) Eduardo Monteiro Corrêa, explica que essa obrigatoriedade implica sanções como as previstas na Portaria nº 597, de 2004, que instituiu o calendário nacional de vacinação. "Ali, é apontado que o indivíduo, não tendo completado o calendário, não poderá se matricular em creches e instituições de ensino, efetuar o alistamento militar ou receber benefícios sociais do governo", afirmou. "Quando a gente está falando de obrigatoriedade, não estou dizendo que a pessoa que se recusar vai ser presa, não é nada disso. Existem coisas obrigatórias no Estado. Por exemplo, o voto é obrigatório, mas ninguém vem na sua casa te obrigar a votar. O que acontece é que se criam sanções", explica Eduardo. Para o advogado e professor, a obrigatoriedade se mostra de maneira tão clara em textos anteriores que nem seria necessário determiná-la na lei 13.979, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em fevereiro de 2020 com formas de enfrentamento ao surto de Covid-19. O texto, no entanto, reforça que a vacinação compulsória pode ser uma das medidas adotadas por autoridades de saúde no controle da pandemia. Caso isso ocorra, Eduardo ressalta que os termos da campanha de imunização devem ser estipulados em uma nova portaria. "Esse dispositivo não cria uma vacina obrigatória em abstrato, até porque não existia vacina quando essa lei foi aprovada. Mas com a aprovação da vacina, o Ministério da Saúde tem, sim, competência para torná-la obrigatória. Isso não significa que vai ser para toda a população. O ministério tem que publicar isso em uma norma jurídica, uma portaria, especificando se vai ser obrigatória, para quem, para que grupos populacionais. Pode ser, por exemplo, só para idosos e para crianças. Isso vai ser definido com base na vacina." Outras previsões legais. Para crianças e adolescentes que não completarem o calendário vacinal, o ECA prevê sanções administrativas aos pais e responsáveis. O parágrafo 1º do artigo 14 é claro ao determinar que é "obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias". A pena pode incutir no pagamento de uma multa que varia de três a 20 salários mínimos. Eduardo Monteiro afirma que se pode, em tese, chegar ao limite da sanção do estatuto, que é a perda de guarda da criança. Para isso, no entanto, seria necessária uma ação judicial. Há, ainda, obrigações específicas para trabalhadores que atuam em regiões como portos e aeroportos. De acordo com a Portaria nº 1.986/2001 do Ministério da Saúde, "é obrigatória a vacinação dos trabalhadores das áreas portuárias, aeroportuárias, de terminais e passagens de fronteira". Por mais que não cite especificamente a imunização, o Código Penal também estabelece punição, em seu artigo 268, a quem "infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa". A pena prevista, nesses casos, é de detenção de um mês a um ano e multa. As punições são aumentadas em um terço se os responsáveis forem funcionários de saúde pública ou exercerem profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro. A determinação dos limites entre o individual e o coletivo cabe ao Estado, detentor do chamado poder de polícia. No Direito Administrativo, esse conceito busca garantir o bem-estar social, impedindo o uso abusivo dos direitos individuais ou a prática de atividades nocivas à coletividade, explica Eduardo Monteiro. De acordo com o advogado, essa característica intervencionista se aplica em ações de saúde pública. "É identificado pela legislação sanitária o interesse público coletivo que permite que seja limitada a liberdade individual. E aí entramos no campo da vacina, que há muito tempo é reconhecida pela sua ideia de proteção da coletividade. Reconhece-se que há interesse público". O advogado Eduardo, frisa que, as vacinas transcendem à escolha individual; por serem (e quando forem) cientificamente recomendadas, o meu direito individual a decidir sobre a minha saúde cede ao direito coletivo de um ambiente livre de coronavírus, por exemplo. "Neste momento não se vacinar é um ato de ignorância, quando deixamos de nos imunizar estamos contribuindo para que vidas sejam ceifadas, contribuímos inclusive para que a economia siga ruindo, é uma decisão individual, mas que traz consequências a um país inteiro. Portanto, vacinem-se, precisamos voltar a vida normal e isto é uma decisão que depende da coletividade, juntos venceremos e dias melhores virão", frisou Eduardo. Na hora de vacinar, o que prevalece: a decisão individual ou o interesse público? Por mais que o direito à liberdade esteja previsto na Constituição, ele não pode ser usado para justificar recusas à vacinação, de acordo com o advogado. Isso porque a alegação esbarra em outro ponto previsto na lei: a supremacia do interesse público.
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