Pediatra alerta para nova síndrome que pode afetar crianças com covid-19
Confira a entrevista com pediatra e homeopata Dr. Gustavo de Lara, que atende em Dourados.
Recentemente a OMS alertou sobre uma nova inflamação que está afetando crianças e adolescentes e pode estar ligada ao novo coronavírus. Do que se trata e quais as complicações?
Dr. Gustavo: Se trata de uma apresentação aguda e grave denominada Síndrome Inflamatória Multissistêmica relacionada ao Covid19. Descrita inicialmente no Reino Unido, e posteriormente na Espanha, Itália, França e EUA, afeta crianças de 4 a 17 anos, de dois a quatorze dias após o início dos sintomas respiratórios característicos da Covid19. Esses pacientes evoluem com complicações em vários sistemas do organismo, com quadro semelhante ao Choque Tóxico ou a Síndrome de Kawasaki, que se caracteriza por um aneurisma gigante da artéria coronária, ou seja, uma dilatação nessa importante artéria que irriga e nutre o coração, necessitando de cuidados em unidade em terapia intensiva. Acredita-se que essa complicação seja decorrente de uma resposta imunológica tardia e desproporcional do organismo em relação a doença. Apesar de rara, essa síndrome reforça que não são apenas os idosos que podem evoluir com complicações na Covid19, e que as crianças também devem ser incluídas nos cuidados referentes a tentativa de diminuir o contágio.
As crianças tem mais resistência ao vírus comparado a outras faixas etárias?
Dr. Gustavo: Não. Como se trata de uma mutação do coronavírus, nenhum ser humano tem anticorpos que combatem esse novo subtipo de coronavírus antes de ser infectado.
Quando acometidos pelo covid-19, os sintomas são os mesmos desenvolvido nos adultos?
Dr. Gustavo: Sim, porém os estudos demonstram uma taxa de internação e de mortalidade menor na faixa pediátrica. No maior estudo realizado até agora, entre as 731 crianças com doença confirmada virologicamente, 94 (12,9%) eram assintomáticas, 315 (43,1%) tiveram quadros leves, e 300 (41%) tiveram quadros moderados, representando juntos 97% dos casos confirmados. As proporções de crianças classificadas como casos graves foram de 2,5% e críticos de 0,6%, sendo substancialmente inferiores às observadas em adultos com COVID-19. Curiosamente, bebês e crianças em idade pré-escolar tinham maior probabilidade de apresentar manifestações clínicas graves do que crianças mais velhas. Os sintomas mais comuns são febre, tosse, dor de garganta, corisa ou rinorréia e fadiga, evoluindo com falta de ar e dor toráxica. Pode estar presente sintomas gastrointestinais com diarréia, dor abdominal, náuseas e vômitos, e mais raramente conjuntivite e manifestações cutâneas como exantemas e urticárias.
Por que geralmente as crianças infectadas se recuperam mais rápido que os adultos?
Dr. Gustavo: Como se trata de uma doença nova, existem algumas teorias para essa menor gravidade, que ainda necessitam de mais estudos para se ter uma compreensão maior desse fenômeno. Uma delas são as diferenças da resposta imune em cada faixa etária, o que geraria uma inflamação menor nas crianças, decorrente de uma menor "tempestade de citocinas", substâncias responsáveis por uma resposta imune desproporcional maior em adultos. Outra hipótese seria de que a imunidade inata das crianças possue uma resposta com mais Células T, que seriam mais eficazes para o combate aos vírus. Existe a possibilidade de imunidade cruzada com outros tipos de coronavírus. Porém a principal teoria seria uma menor expressão nas células pulmonares dos receptores usados pelo coronavírus para adentrar nas células, chamado de Enzima Conversora de Angiotensina, ou ECA2. Todas essas teorias ainda necessitam de mais estudos para se desvendar qual desses fatores é o que mais contribui para essa menor gravidade nos casos pediátricos.
Entre as crianças também há um 'grupo de risco', assim como entre os adultos? Alguma doença infantil ou outro fator pode fazer com que a criança venha a óbito caso seja infectada pelo vírus?
Dr. Gustavo: Sim, existem os grupos de risco. As doenças respiratórias alérgicas não são do grupo de risco, como a asma e a rinite, por uma série de fatores, incluindo uma menor expressão do ECA2 nas células de epitélio da árvore respiratória desses pacientes. Porém crianças obesas, diabéticas, hipertensas, recém nascidas ou imunocomprometidas, são sim um grupo de risco, pois apresentam uma maior chance de complicações graves. Se incluem nesse grupo também crianças com cardiopatias com repercussão hemodinâmica, e com algum erro inato do metabolismo ou com alguma imunodeficiência primária ou adiquirida.
Quais os principais cuidados que os pais devem ter para evitar que as crianças se contaminem com o vírus?
Dr. Gustavo: O Ministério da Saúde recomenda ações preventivas diárias para ajudar a prevenir a propagação do vírus respiratórios em geral, incluindo: Lavar as mãos frequentemente com água e sabonete por pelo menos 20 segundos, respeitando os 5 momentos de higienização. Se não houver água e sabonete, usar um desinfetante para as mãos à base de álcool; Evitar tocar nos olhos, nariz e boca com as mãos não lavadas; Evitar contato próximo com pessoas doentes; Ficar em casa quando estiver doente; Cobrir boca e nariz ao tossir ou espirrar com um lenço de papel e jogar no lixo; Limpar e desinfetar objetos e superfícies tocados com frequência. Além de cumprir com as normas descritas nos decretos da prefeitura acerca do distanciamento social, e dos cuidados quando for necessário sair de casa. No geral, as saídas necessárias para compra se suprimentos básicos, alimentícios ou medicamentosos, devem ser feitas sem a presença da criança. Deve-se tentar evitar ao máximo lugares fechados e com aglomerações, como comércios, igrejas e transporte público.
No caso especifico dos bebês, eles necessitam de cuidado especial? Podem ter contato com álcool em gel e usar máscara?
Dr. Gustavo: Como os bebês podem apresentar um risco maior de complicações devemos redobrar os cuidados com eles. Eles podem ter contato com álcool gel e a lavagem das mãos com água e sabão, porém, como até dois anos não é recomendável o uso de máscaras, os cuidados interpessoais, ou seja, de quem tem contato com o bebê devem ser redobrados. Pessoas com quadro suspeito de Covid19, ou que tiveram contato com pessoas diagnosticadas com coronavírus devem tem o bom senso de não chegar perto de bebês sem os devidos cuidados.